Os brasileiros estão reduzindo o consumo de serviços básicos, como água, luz, telefone e gás, para manter o orçamento sob controle. Com 81%, as contas da casa foram o principal item escolhido para economizar por quem está encontrando dificuldades em manter as contas em dia, de acordo com uma pesquisa do Instituto Datapopular divulgada ontem sobre o impacto da inflação na Classe C.
O estudo indica que 69% dos integrantes da nova classe média brasileira vêm encontrando dificuldades para controlar o orçamento doméstico, enquanto 89% dos entrevistados, quase nove em cada dez, reconhecem que não conseguem mais comprar itens que faziam parte da lista de consumo há um ano. A pesquisa do Data Popular ouviu 2.004 pessoas, em julho.
A explicação para os números, segundo o Datapopular, estaria em uma defasagem entre a renda da população e os preços dos produtos, que estariam crescendo em uma velocidade maior.
Os preços dos alimentos foram os mais reclamados pelos entrevistados, seguidos dos produtos de limpeza, educação e material escolar, além das roupas.
Estratégia
Para controlar os gastos, a psicóloga Taís Oliveira, de 26 anos, passou a racionalizar as compras de alimentos no supermercado. Fez as contas e percebeu que a família faz boa parte das refeições fora de casa. Os almoços em família costumam acontecer basicamente nos finais de semana, quando ela e o marido têm a oportunidade de fazer as refeições juntos com a filha de 1 ano e quatro meses.
Além disso, Taís passou a pesquisar o preço dos materiais imprescindíveis na rotina da sua filha, como papinha, frutas, leite e fralda. “Hoje em dia, tenho uma base de tudo o quanto ela consome por mês e, a partir daí, já sei onde encontrar os melhores preços”, conta.
Taís, que trabalha na área de recursos humanos de uma empresa, revela que, normalmente, no dia 10 de cada mês já não tem mais nada do salário que recebe, de aproximadamente R$ 2,7 mil. “Até o dia 8, pago logo as contas de água, luz, aluguel, plano de saúde e mercado do mês. Só sobra o dinheiro do transporte e os R$ 4 do café da manhã, que tomo em uma lanchonete aqui perto. Com isso, não dá muito pra extrapolar”, explica. Além disso, os compromissos mensais incluem uma ajuda ao pai.
“Apesar de termos máquina de lavar, fogão, geladeira e televisão, eu e meu companheiro, por passarmos muito tempo fora, sempre que podemos desligamos os eletrodomésticos da tomada”, diz.
Educação
Para o coordenador do curso de Economia da Universidade Salvador (Unifacs), Gustavo Casseb, o grande problema da nova classe média brasileira está na falta da chamada educação financeira.
“Esse público não tem a educação financeira como hábito. É oriundo das classes mais baixas, que ao longo dos últimos anos apresentou um grande crescimento de renda por conta da estabilidade econômica. A gente tem convivido com um momento muito bom do ponto de vista do emprego formal, do aumento do salário mínimo em níveis reais, do rendimento do brasileiro de modo geral”, explica.
Para ele, o que acontece agora é reflexo do fenômeno de inclusão de pessoas no mercado de consumo. “A conta está sendo cobrada três, quatro anos depois. Estudos evidenciam que as famílias brasileiras estão mais endividadas. O percentual de famílias que utilizam cartões é de 85%. Aí, nós temos entre 60% e 63% dessas pessoas endividadas. Elas não conseguem pagar as dívidas. Não são pessoas que têm débitos e conseguem pagar”, ressalta.
O Indicador Serasa Experian Inadimplência do Consumidor indica que os consumidores brasileiros não conseguiram dar conta de 4% dos compromissos financeiros assumidos no mês de julho. Um outro indicador da mesma entidade, o de cheques sem fundos, mostra que a inadimplência também aumentou no meio de pagamento, que ainda é utilizado em algumas operações comerciais.
Mas para o economista Gustavo Casseb, o indicador que mais preocupa é o que mostra dificuldades para dar conta do pagamento de contas essenciais. “É um dado bastante preocupante esse aumento, porque mostra uma dificuldade de dar conta do que é básico, de serviços que não dá para viver sem. Isso é uma prova de quão perigosa é essa situação do endividamento”, analisa, lembrando que boa parte da população tem o costume de gastar tudo o que ganha.
Fonte: Correio
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